24 de nov. de 2009

Sobre efeitos eleitorais

Folha Online

Véspera de eleição costuma ser período de farra no mundo da política. Quase tudo é permitido. Aquilo que era negado por anos, de repente torna-se possível e viável para agradar o eleitorado. É tempo de ataque aos cofres públicos. Mas nem sempre os efeitos de uma eleição devem ser contabilizados apenas na coluna vermelha. Em alguns episódios, premido pela proximidade de uma campanha presidencial, o presidente de turno é levado a avançar em temas que, normalmente, costuma-se caminhar bem devagar.

Foi o caso das metas de corte nas emissões de gases de efeito estufa. O governo não estava disposto a transformar em lei aquilo que havia divulgado como compromisso voluntário --uma redução entre 36,1% e 38,9% das emissões de carbono estimadas para 2020. Na última hora, porém, veio uma ordem do presidente Lula para que as metas fossem incluídas na Política Nacional de Mudanças Climáticas, aprovada recentemente na Comissão de Infraestrutura do Senado. E assim foi feito por conta do "efeito Marina". Ou seja, se o governo não incluísse os "compromissos voluntários" no plano em tramitação no Senado, a pré-candidata Marina Silva (PV-AC) o faria, capitalizando sozinha os dividendos políticos de tal iniciativa.

A própria definição dos "compromissos voluntários" assumidos pelo governo Lula já havia sido decidida também por conta do "efeito Marina". Afinal, é preciso tentar tonificar a pré-candidata Dilma Rousseff no próximo ano. Em outras palavras, o componente eleitoral fez o governo ficar um pouco mais verde nessa reta final de mandato. O que é bom para o país.

Outro caso

Ainda na lista daquilo que não deve ser contabilizado na coluna vermelha quando se trata de efeitos de uma eleição, é possível também citar o caso dos projetos em tramitação na Câmara que tratam de aumento de gastos com aposentadorias do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Pelo menos até aqui, o presidente Lula já sinalizou que vetará todos os projetos que forem aprovados na Câmara --são três, ao todo-- sem uma negociação com o governo que implique redução no tamanho dos gastos. Em síntese, os três projetos têm o efeito de dar aumentos reais aos aposentados na mesma proporção do salário mínimo e pôr fim no mecanismo que desestimula a aposentadoria precoce. Eleitoralmente, o melhor caminho seria deixar a Câmara aprovar e faturar politicamente com os aposentados --de olho na eleição presidencial. Mas Lula está disposto a vetar os tais projetos. A conferir.

Isso não desfaz, contudo, a responsabilidade do governo Lula pela ameaça que ronda os cofres da Previdência. Em termos de justiça, pode-se até argumentar que os aposentados merecem reajustes reais na mesma dimensão do salário mínimo. Só que, hoje, o caixa da Previdência Social não suporta tais despesas. E quem pagará a conta, lá na frente, são as futuras gerações. Tudo por que o governo Lula, tal como seu antecessor, pouco fez no campo da reforma previdenciária. Petistas e tucanos ficaram nas medidas paliativas, que apenas protelaram o desastre. Mais uma vez, a tarefa ficará para a próxima administração. Como também ficará para o sucessor de Lula a missão de colocar as contas públicas em ordem. Esse, sim, um efeito negativo da eleição nessa reta final de mandato do petista. Não estamos numa situação de insolvência, mas o cenário no médio prazo é de deterioração do equilíbrio fiscal. O aviso não vem só de gente da oposição, mas também dos conselheiros econômicos de Lula. É o caso do ex-ministro Delfim Netto, que alertou para o risco que o país corre no futuro se a curva dos gastos públicos não for invertida.

Outros efeitos

A última pesquisa Sensus mostra que os recentes ataques do ex-presidente FHC a Lula podem ter rendido uma boa polêmica e ocupado bom espaço na mídia, mas seus efeitos sobre a pré-candidatura do governador José Serra (PSDB-SP) não foram nada alentadores. Ele só caiu nas intenções de voto, enquanto Dilma Rousseff cresceu. Mais um sinal de que Serra, ou Aécio Neves, terão de fugir da sombra do ex-presidente tucano se quiserem ganhar a eleição. Em outras palavras, eles vão torcer para que FHC volte a ficar na muda.

http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/valdocruz/ult4120u656556.shtml

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