Valor Econômico
MANAUS - No momento em que o tucano José Serra desencadeou uma ofensiva para consolidar sua posição de favorito à indicação do PSDB, a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) virtualmente assumiu sua candidatura a presidente ontem, na inauguração do gasoduto Urucu-Coari-Manaus - 661 quilômetros de tubulações incrustadas em meio à densa selva amazônica.
Fazia um calor de 41 graus quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acionou a válvula que levará o gás de Urucu a Manaus e já chega a oito cidades amazônicas por meio de uma rede de 140 quilômetros de ramais. Mas só 1,6% da produção (77 mil m3/dia), inicialmente. Em janeiro de 2010 é que serão alcançados 253 mil m3/dia.
O gasoduto tem capacidade inicial para transportar 4,1 milhões de m3/dia e deve chegar a 5,5 milhões em setembro de 2010, quando terão sido transformados os motores das termelétricas a diesel que atualmente abastecem a região. É pouco, portanto, o uso imediato de Urucu. Mas a inauguração do gasoduto é uma das primeiras grandes obras inauguradas pelo presidente Lula - começada e terminada em seu mandato. Além disso trata-se de uma obra da Petrobras, empresa que teve Dilma Rousseff no comando, quando a atual chefe da Casa Civil era ministra das Minas e Energia. Panfletos que circularam em Manaus sob o título " O Gás é Nosso " - referência à campanha nacionalista do petróleo nos anos 50 - destacavam o papel que a ministra desempenhou para a execução de uma obra prometida e nunca cumprida por quatro presidentes da República - José Sarney, Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, em seus dois mandatos.
Dilma vestia uma camiseta branca adequada ao forte calor, enquanto Lula secava repetidamente o rosto. A ministra fez um discurso tecnocrático, mas que encadeava as ideias de modo a comparar as duas últimas gestões que passaram pelo Planalto - a de Lula, atual, e a dos oito anos de FHC - de modo a permitir o desfecho com a apresentação de sua candidatura: " Nós sabemos que o governo do presidente Lula significa um mudança no caminho que o Brasil vinha trilhando no passado " , disse Dilma, após falar de outros temas que nada tinham em comum com o gasoduto, como educação e a rede de segurança social. " E nós todos juntos temos a missão, a obrigação e o dever de fazer esse projeto continuar, de fazer esse projeto avançar " .
Dilma agiu com a desenvoltura de candidato. Cumprimentou os convidados da Petrobras para o evento, recebeu cartas e bilhetinhos da plateia e enumerou uma a uma as autoridades presentes no palanque, inclusive, nominalmente, os sete prefeitos da região beneficiada pela obra que estavam presentes. Permitiu-se inclusive a uma troca de beijinhos protocolares com o prefeito de Manaus, Amazonino Mendes, um ex-pefelista agora no PTB (partido aliado) que, na véspera, escapara da perda do mandato por compra de votos em um julgamento por apenas um voto de diferença O presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, também atribuiu à " determinação " da ministra a conclusão da obra já prometida por outros presidentes, no passado. O governador do Amazonas, Eduardo Braga (PMDB) classificou a ministra de " uma brasileira especial " . A cada uma dessas intervenções Dilma era aplaudida pelos convidados e populares presentes.
O presidente Lula disse que voltará em setembro de 2010 a Manaus para inaugurar o efetivo uso de gás pelas termelétricas amazônicas, uma das grandes responsáveis pela emissão de gases responsáveis pelo efeito estufa. E fez questão de lembrar que nem o governador Eduardo Braga nem o ministro Alfredo Nascimento estariam presentes porque serão candidatos a cargos eletivos - Braga ao Senado, e Nascimento, provavelmente, ao governo estadual.
" O Eduardo não vai estar, porque é candidato, o Alfredo não vai estar, porque acho que é candidato, a Dilma não vai estar, porque acho que é candidata. Mas eu não sou candidato, esta rei aqui para apertar o botão de todas as empresas, usando gás na energia elétrica deste Estado " , disse o presidente. Nas viagens-comícios que tem realizado com Dilma o presidente Lula sempre fez referência à candidatura de sua ministra. Mas esta foi a primeira vez que a própria Dilma falou com ênfase sobre o projeto sucessório do PT e tratou de se comportar como candidata em campanha, no limite permitido pela legislação. Como candidata bem treinada, Dilma conseguiu sair a contento de situações constrangedoras. Uma delas: agora no PTB, o prefeito Amazonino Mendes é um aliado do governo federal. Durante o ato de inauguração foi sistematicamente vaiado e chamado de " mentiroso " pela plateia, que além de funcionários da Petrobras e populares, tinha também uma trupe do PCdoB.
Um coro de " não dá não " se seguiu a um pedido de Amazonino por verbas para Manaus. Quando falou, Dilma apenas fez referência à parceria com a prefeitura da cidade. E ouviu a vaia que se seguiu a Amazonino, impassível, sem mover um músculo. Lula também ironizou Caetano Veloso quando usou a expressão " en passant " , durante seu discurso - " o Caetano deveria ouvir eu dizer isso " - e por mais de uma vez falou dos " invejosos " que não querem que o país dê certo, uma alusão nada velada ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
" Quem não conseguiu, de forma saudável, em um parto normal, parir esse gasoduto, está do lado de fora morrendo de inveja e querendo fazer todas as críticas possíveis e impossíveis " .
(Raymundo Costa | Valor)
http://www.valoronline.com.br/?online/politica/6/5969857/dilma-age-como-candidata-em-manaus
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