Folha
Partido quer vaga de vice de Dilma, mas volta a ameaçar Planalto, tem candidato próprio e não exclui apoiar Serra
SOLIDEZ doutrinária nunca foi uma característica notável em partidos políticos brasileiros. PT e PSDB, com alguma boa vontade, podem até ser descritos como agremiações programáticas, respectivamente de centro-esquerda e centro. Jamais o PMDB, que ambos cobiçam como aliado na campanha presidencial.
É mais comum estigmatizar a agremiação-ônibus como reduto do fisiologismo. Este é um nicho tradicional do mercado político, em que o PMDB tende a predominar, no momento em que o Democratas enfrenta uma crise, apesar do verniz liberal (centro-direita), alvejado como foi pela denúncia de corrupção contra seu único governador, José Roberto Arruda (que se desfiliou para escapar da expulsão certa).
A força do PMDB é inegável. Seis ministros, nove governadores, mais de um milhar de prefeitos, 88 deputados federais, 17 senadores e os dois presidente das Casas do Congresso podem criar muitos problemas para um aliado político. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva que o diga.
Um exemplo recente: mesmo depois de selado o pré-compromisso eleitoral com o PT que eventualmente daria ao presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), a vaga de vice na chapa com Dilma Rousseff, Temer defendeu a pré-candidatura própria do PMDB, ambicionada por Roberto Requião, governador do Paraná.
Temer manifestou o apoio numa ocasião especial, a eleição do presidente de seu partido em São Paulo. Aliados petistas dão como certo que o grupo de Temer foi decisivo para a vitória de Orestes Quércia, que deverá apoiar no maior colégio eleitoral do país o grande adversário de Dilma, o governador tucano José Serra.
Trata-se de uma reação típica do PMDB. Neste caso, à sugestão feita por Lula de que o aliado apresente uma lista tríplice de nomes para a vaga que ao menos Temer já contava como sua.
De um só golpe os peemedebistas ameaçam retirar da pré-candidata palaciana, de modo pouco sutil, a possibilidade de dobrar seu tempo de campanha na TV e mantêm aberto um canal de negociação com o governador paulista. Vença Serra ou Dilma, os dois pré-candidatos mais bem colocados nas pesquisas de intenção de voto, o PMDB estará onde sempre esteve -no poder, ou consorciado com ele.
Não se trata de um partido, para ser rigoroso, mas de uma federação de grupos regionais unidos na prática renitente do patrimonialismo. A lógica de sua atuação é ocupar cargos públicos para obter vantagens pessoais e sustentar máquinas partidárias locais, baseadas no clientelismo. Não raro essa atividade política abastardada resvala para a corrupção pura e simples.
Não é apanágio do PMDB, longe disso. Esse estilo encontra na agremiação, contudo, um exemplo de manual dos costumes políticos arcaicos que imperam na maior parte do país. Nesse sentido, o partido de Michel Temer, José Sarney, Roberto Requião e Orestes Quércia representa muito mais que seus eleitores -é o retrato fiel do que há de mais atrasado na política brasileira.
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