Correio Brazziliense - Ullisses Campbell
São Paulo — Vinte anos depois da queda do muro de Berlim, o comunismo já não é mais o mesmo. O PCdoB continua se adaptando aos novos tempos. Em Cuiabá, o partido anda de mãos dadas com o PSDB, que administra a cidade. No Rio de Janeiro, a legenda tem um ninho na Secretaria Municipal de Cultura da prefeitura de Eduardo Paes (PMDB). No plano nacional, o partido apoia o governo de Luiz Inácio Lula da Silva e ocupa dois ministérios. Foi-se o tempo em que os comunistas pegavam em armas e se embrenhavam na selva amazônica para tentar fundar um modelo de nação independente. Ficaram também para trás os princípios do marxismo-leninismo (1) que faziam o grande diferencial do partido.
Renato Rabelo, presidente nacional do PCdoB, quer transformar a legenda em um partido moderno
Atualmente, os membros do PCdoB não se vestem mais de vermelho e muito menos falam mal do governo, até porque eles fazem parte da base aliada de Lula. No entanto, o que marca a maior mudança na legenda são os tons amenos com que seus líderes falam ao microfone. No congresso que o partido promoveu na semana passada, os comunistas que se exaltavam na hora de falar eram mal vistos pelos membros mais jovens. “Acho que o radicalismo de ontem não tem mais espaço”, ressalta o estudante paulista Ricardo Ortega, 19 anos.
O deputado federal Aldo Rebelo (SP), da comissão política do partido, assume que o tom dos discursos ficou mais brando, mas ele discorda que o foco dos comunistas tenha mudado. “Não estamos mais em um governo ditador. Há diálogos e interesses comuns com o PT”, ressaltou.
A maior evidência de que o PCdoB vive novos tempos vem de Cuiabá, onde o comunista Aislan Galvão, presidente da legenda em Mato Grosso, ajudou o atual prefeito da cidade, Wilson Santos (PSDB), a se eleger. “Foi uma decisão que exigiu muita discussão dentro do partido, muito debate. Pessoalmente, nós apoiamos o prefeito Wilson. Nacionalmente, o PCdoB tem uma relação de proximidade com o PSDB”, justifica Galvão.
Light
O site da deputada comunista Alice Portugal é outra evidência de que o partido agora é “light”. A página virtual é toda feita em três tons de lilás e nem de longe lembra a legenda que tem o vermelho em sua bandeira. O martelo e a foice, símbolos da classe operária, aparecem tão minúsculos no site que mal dá para perceber. Mas é nas ideias que a deputada mostra um discurso em tom pastel. “Nós achamos que Lula faz um governo de frente, de transição, de coalizão. Tem comunistas, socialistas, democratas e até homens de visão conservadora. Apesar dos problemas, nós apoiamos esse governo por entendermos que foi o primeiro de fato a ter olhos para a sociedade brasileira e para os mais pobres”, diz a deputada.
Em 2006, o partido que organizou a Guerrilha do Araguaia na Amazônia com o intuito de fundar uma nação independente para enfrentar o regime militar finalmente chegou ao poder. Na ocasião, Lula fez uma viagem oficial à Venezuela e o vice-presidente, José Alencar, estava nos Estados Unidos, em tratamento contra o câncer. O então presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo, assumiu o principal gabinete do Palácio do Planalto. “É a história do avesso, pois o PCdoB promoveu a guerrilha que foi combatida pelos militares. Enquanto estava na cadeira de Lula, Aldo foi o comandante dos militares, que ainda escondem os arquivos do regime militar. Se quisesse, Aldo podia ter recusado a missão. Mas a vaidade falou mais alto”, diz o historiador Régis Costa e Silva, comunista de carteirinha.
Costa e Silva reconhece que não há mais espaço no século 21 para o discurso que o PCdoB pregava na década de 1970. “O comunismo é um sistema econômico que nega a propriedade privada dos meios de produção. Nesse sistema, os meios de produção são de propriedade comum a todos os cidadãos e são controlados por seus trabalhadores. Mas esse sonho faz parte do passado. Se quiser ter qualquer tipo de poder, o partido vai ter que se unir ao PT, que, por sua vez, tem o PMDB de Jader Barbalho como aliado”, critica.
No 12º congresso do partido, encerrado nesse domingo (8/11), em São Paulo, o presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, disse em discurso que a aliança de seu partido com o PT e com o presidente Lula é vital para os comunistas. “O PCdoB tem sido parceiro no que hoje é o governo Lula. Nossa aliança não é ocasional e fortuita, mas forjada no decorrer de extensa luta política e social. As duas vitórias do presidente têm imenso significado para os comunistas”, defendeu.
1- Revolução
Karl Marx defendia a revolução do proletariado contra a burguesia, a tomada do poder e a construção de uma sociedade socialista. Para isso, a classe operária teria que ter uma mentalidade revolucionária. Lenin adaptou as teorias de Marx para a realidade russa, que era um país agrícola atrasado e sem nenhuma consciência revolucionária. Segundo ele, a revolução pode ser possível por meio da união dos trabalhadores da cidade e do campo e fazendo uso do comunismo.
Sobrevivência é palavra de ordem
Ao encerrar o 12º Congresso Nacional do PCdoB, ontem em São Paulo, o presidente reeleito do partido, Renato Rabelo, deu sinais de que os comunistas precisam modernizar o discurso caso queiram sobreviver nos dias de hoje. “É correto o pensamento de transformar o PCdoB em um partido moderno. O partido não é a sua história, ele está em função dos desafios de cada época”, frisou.
A legenda elegeu no encontro a nova diretoria, que tem como missão colocar em prática o novo programa partidário. Dessa vez, os líderes não falam mais em um país governado pela classe operária e sem estatais, como se pregava no passado. O novo programa está baseado em quatro questões fundamentais: soberania e independência nacional; democratização da sociedade e universalização de direitos; progresso social mais avançado; e a integração solidária da América do Sul. “Agora temos horizontes definidos, um rumo. Vamos apresentá-lo às forças políticas, aos aliados e ao povo. A Dilma Rousseff disse que queria tomar conhecimento dos documentos do partido. É o primeiro passo para lidar com o enfrentamento político que teremos mais adiante, disse Rabelo.
Hoje, o PCdoB tem 105 membros no comitê central eleitos no congresso ontem, contra 81 em 2005. “O partido procurou articular um processo de renovação e adequação às exigências do novo tempo”, justifica Rabelo. A Comissão Política conta com 26 nomes, entre eles, o do ministro do Esporte, Orlando Silva, o do deputado federal Aldo Rebelo e do diretor-geral da Associação Nacional do Petróleo, Haroldo Lima.
Como o PCdoB anda de mãos dadas com o PT e aposta na eleição de Dilma Rousseff em 2010, Rabelo não perdeu a oportunidade de demonstrar esse apoio explicitamente na frente da própria candidata ao rebater duramente as críticas do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que classificou o governo Lula de “república sindicaleira” e de “autoritarismo popular”. “FHC está desesperado. Ele vem com críticas que caem na vala comum de uma sociologia de araque”, afirmou. “Temos que prosseguir com a Era Lula e impedir a volta de um governo neoliberal à Presidência da República”, discursou.
"É correto o pensamento de transformar o PCdoB em um partido moderno. O partido não é a sua história, ele está em função dos desafios de cada época"Renato Rabelo, presidente do PCdoB
http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia182/2009/11/09/politica,i=153535/PCDOB+COM+ALIADOS+COMO+PT+PMDB+E+PSDB+RUMA+A+CAMINHO+DA+MODERNIZACAO.shtml
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