Valor Econômico - Ricardo Balthazar, de Washington
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem duvidar que a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, seja capaz de resistir a pressões como as que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sofreu de grupos insatisfeitos com a maneira cautelosa com que ele administrou a economia do país em seus dois mandatos.
"Não sei se ela será capaz de conter o ímpeto que existe no seu campo contra o que precisa ser feito no país", afirmou Fernando Henrique, ao responder a uma pergunta sobre a eleição presidencial do próximo ano durante um evento promovido pelo Wilson Center, um centro de estudos sediado em Washington.
Ressaltando a continuidade existente entre o seu governo e o de Lula na gestão da economia, o ex-presidente disse que ela só foi possível porque Lula "foi capaz de negar tudo que disse a vida inteira" e soube resistir a pressões do PT, dos movimentos sociais e de outros grupos que o ajudaram a alcançar o poder.
"Não sei se ela seria capaz de lidar com esses grupos", afirmou Fernando Henrique Cardoso. Ele disse considerar Dilma "séria", mas classificou a candidata de Lula como mais "imprevisível" que os dois aspirantes que disputam a indicação do seu partido, o PSDB, os governadores de São Paulo, José Serra, e Minas Gerais, Aécio Neves.
O ex-presidente disse que o sucessor de Lula herdará uma situação fiscal "difícil", como resultado da acelerada expansão dos gastos do governo federal. Ele defendeu a realização de reformas para conter a deterioração das contas da Previdência Social, apesar de reconhecer que seria difícil vencer a oposição dos sindicatos e de outros grupos no Congresso.
Fernando Henrique acusou o governo Lula de ser "complacente" com as tentativas que o Congresso tem feito para acabar com o fator previdenciário, um mecanismo criado no governo tucano para frear o crescimento dos gastos da Previdência. "O próximo presidente precisará de vontade política para lidar com isso", disse. "Nessa área, a continuidade será um desastre."
Reafirmando a tese que defendeu num artigo publicado em novembro, Fernando Henrique disse que a chegada de Lula ao Planalto enfraqueceu o sistema político brasileiro ao estimular a formação de blocos de poder dominados pelos aliados do PT nos fundos de pensão e nas empresas que eles controlam, e que seriam capazes de exercer sua influência à margem dos partidos políticos tradicionais.
O ex-presidente afirmou que a "fragmentação" do sistema político do país transformou os partidos em "câmaras de compensação de grupos de interesse" que teriam dado às costas para a sociedade. Mas ele considerou inviável a convocação de uma assembleia constituinte para discutir reformas no sistema eleitoral e nos partidos, como Lula sugeriu na semana passada.
Em outro evento do qual participou ontem em Washington, organizado pelo Diálogo Inter-Americano, um centro de discussões sobre o relacionamento entre os Estados Unidos e a América Latina, Fernando Henrique criticou a política externa brasileira e os esforços que Lula tem feito para ampliar sua atuação no palco internacional.
O ex-presidente acredita que Lula errou ao tentar interferir em questões espinhosas como a crise política em Honduras e o conflito entre Israel e a Palestina sem ter força para obter resultados. "O Brasil devia aprender com a China", disse Fernando Henrique. "Nós achamos que precisamos ter uma posição sobre tudo, eles são muito mais cautelosos."
Numa rápida entrevista a um grupo de jornalistas depois do evento, o ex-presidente afirmou que o Brasil deveria fazer como os EUA e reconhecer a legitimidade da eleição presidencial realizada por Honduras há duas semanas, em que foi eleito o conservador Porfírio Lobo. O Brasil exige a restauração do presidente deposto Manuel Zelaya, derrubado por um golpe de Estado há cinco meses.
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