6 de ago. de 2010

Debate insosso e um franco-atirador

No primeiro debate televisivo da corrida presidencial, Serra e Dilma polarizam discursos, Marina mostra-se discreta e Plínio salva a noite

Correio Braziliense - Tiago Pariz


Os candidatos do PT, Dilma Rousseff, e do PSDB, José Serra, dividiram a atenção do primeiro debate entre os presidenciáveis. Num clima morno com ocasionais trocas de farpas, os candidatos começaram extrapolando o tempo permitido e exibindo nervosismo. A monopolização foi tamanha que coube ao candidato do PSol, Plínio de Arruda Sampaio, dar o tom mais irônico ao protestar contra o blocão formado pelos dois principais concorrentes ao Planalto e lançar provocações que o levaram ao topo dos Trending Topics (assuntos mais comentados) no Twitter mundial.

Enquanto Marina permaneceu mais amistosa, fazendo elogios à política social do governo, Dilma passou longe de se escorar no presidente Lula, seu padrinho político. Orientada a andar com as próprias pernas, ela mencionou Lula pela primeira vez só no início do terceiro bloco. O debate começou propositivo, mas, no meio de discursos de palanque, um não perdeu a oportunidade de alfinetar o outro.

O primeiro embate girou em torno da geração de empregos. Dilma buscou fazer Serra comparar as gestões de Lula e de Fernando Henrique. Serra disse que não faria política olhando para o retrovisor e que miraria o futuro e atacou o que chamou de sucateamento de aeroportos, da infraestrutura portuária e das rodovias. A petista rebateu com uma estocada: “É muito confortável esquecer o passado, mas não acho prudente”, disse, enfatizando que o governo Lula criou 14 milhões de empregos formais.

O monopólio foi quebrado depois que Serra e Dilma responderam sete perguntas seguidas. A candidata do PT quebrou a lógica e dedicou uma pergunta a Marina Silva, sobre políticas de combate ao uso e tráfico de crack. Plínio de Arruda Sampaio respondeu a um só questionamento e reclamou do isolamento. “A desigualdade está aqui. Eu sou o menos perguntado”, clamou. Quando teve chance de falar, cobrou dos candidatos posicionamento sobre reforma agrária e redução da jornada de trabalho.

Um dos carros-chefes de Serra, a questão dos deficientes físicos foi abordada pelo tucano para criticar o governo Lula. “O Ministério da Educação quis proibir a Apae de ensinar, dar o ensino primário, assistência. Uma crueldade”, criticou Serra. Na resposta, Dilma disse que o governo federal manteve apoio não apenas às Apaes, mas a todos os projetos de acessibilidade.

Só na metade final do debate é que Lula materializou-se nas palavras da candidata do PT. Ao pedir que o tucano avaliasse a indústria naval e o programa Luz Para Todos, Dilma citou Lula. Serra elogiou os programas, lembrando que o Luz Para Todos começou no governo FHC, mas partiu para o ataque ao questionar os motivos que levaram o governo Lula a acabar com os mutirões de Saúde.
Sugiro (a Dilma) que vá até Salvador e veja o que é um porto congestionado. Andar nas estradas é um perigo público
José Serra, candidato do PSDB à Presidência da República

"Muito confortável esquecer o passado, mas não é prudente. Nós chegamos a 14 milhões de empregos criados"
Dilma Rousseff, candidata do PT à Presidência da República

"Hoje, investimos apenas 5% do PIB em educação. Estamos atrás do Chile, que está 30 anos na nossa frente"
Marina Silva, candidata do PV à Presidência da República

'Vocês estão podendo perceber aqui porque o José Serra é tão hipocondríaco: ele só fala de saúde”
Plínio de Arruda Sampaio, candidato do PSol à Presidência

"A desigualdade está aqui. Eu sou o menos perguntado”
Plínio de Arruda Sampaio, candidato do PSol

Na chegada, cordialidade

Daniela Almeida

São Paulo — A chegada dos três presidenciáveis mais bem colocados nas pesquisas de intenção de votos, Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV), ao primeiro debate transmitido pela TV, ontem, seguiu a cartilha da cordialidade. Para evitar o trânsito intenso no Morumbi, Zona Oeste de São Paulo, todos chegaram de helicóptero.

O clima entre o trio antes do debate era de respeito. A petista fez questão de cumprimentar Serra e Marina. Os pleiteantes se divertiram com as imagens de debates anteriores, exibidos antes do primeiro bloco. O candidato tucano foi o último a chegar e, atrasado, não falou com a imprensa. Serra estava acompanhado da esposa, Mônica. O candidato a vice Índio da Costa (DEM) chegou sozinho e adiantou que os principais assuntos atacados pelos tucanos seriam a saúde, tema dominado por Serra, que foi ministro da Saúde, e a segurança, que estaria apresentando índices positivos no estado de São Paulo.

Como no primeiro evento com a presença dos três pleiteantes, em Minas Gerais, Marina foi a primeira a chegar. Estava acompanhada do vice, Guilherme Leal, de assessores e de coordenadores políticos. Aparentando calma, a senadora licenciada falou com a imprensa sobre sua disposição de dialogar com todos e prometeu não subir o tom.

A ex-ministra-chefe da Casa Civil e candidata do governo chegou acompanhada da primeira-dama Marisa Letícia, do ex-ministro Antonio Palocci, do presidente do PT José Eduardo Dutra, do candidato a vice Michel Temer (PMDB), do candidato ao governo de São Paulo Aloizio Mercadante (PT) e da candidata ao Senado por São Paulo Marta Suplicy (PT). Marisa, aliás, foi uma das que mais se divertiu com os ácidos comentários de Plínio de Arruda Sampaio.

Os tucanos, impacientes e preocupados em monitorar a reação dos internautas, também saíram do sério quando Plínio disse não se surpreender com a fama de hipocondríaco de Serra, já que ele só “falava em saúde”.

Dilma, por sua vez, gaguejou um pouco e recorreu a spray para a garganta em alguns momentos críticos. “Acho que esse debate é importante. Esclarece. Constrói a democracia”, comentou.

Um show um tanto insosso

Sergio Maggio

A Band até que tentou dar um clima de show ao primeiro debate presidencial. Mostrou bastidores com a chegada dos presidenciáveis em helicópteros, fez um flashback de encontros históricos, mostrou alguns antigos barracos entre candidatos antológicos e pôs a música de abertura na batuta do maestro João Carlos Martins. No entanto, o confronto de ideias foi morno. Os políticos pareciam mais preocupados em traçar estratégias combinadas com as assessorias.

Nervosa, Dilma Rousseff, por exemplo, abusou do “nós” e do “nosso” para articular a sua imagem ao governo Lula, mesmo só citando o presidente a partir do terceiro bloco. Pouco objetiva, estourou tempo, esticou pausas e, por vezes, se esqueceu das câmeras, deixando de olhar para o “povo brasileiro”. “Foi pra lá, foi pra cá”, como definiu com precisão Plínio de Arruda Sampaio (PSol), que aproveitou o tempo que teve diante das câmeras para dizer aos eleitores. “Eu existo”, e “sou a divergência”.

Se Plínio foi incisivo em sua imagem forte, firme e irônica, José Serra (PSDB) manteve-se no tom de sempre, técnico, com pouco espaço para o humor, para a ironia nas deixas dos concorrentes, com a sensação de respostas prontas para as réplicas e as tréplicas. No contraponto, Marina Silva (PV), mais tranquila e leve, conseguiu misturar propostas com história pessoal, o seu trunfo para crescer na campanha. No geral, ficou a saudade dos debates de carne e osso, no qual os discursos prontos caem por terra e o eleitor pesca alguma brecha de espontaneidade.


Dilma abre frente na Sensus

Josie Jeronimo

Os tucanos chiam, mas três dos quatro principais institutos de pesquisas do país registram a candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, à frente na corrida pelo Palácio do Planalto. Na sondagem do CNT/Sensus divulgada ontem, a ex-ministra aparece 10 pontos à frente do candidato do PSDB, José Serra. A petista tem 41,6% contra 31,6% do tucano e 8,5% de Marina Silva (PV). Cientistas políticos avaliam que Dilma agora começa a andar com as próprias pernas.

A candidata do PT tinha na última consulta do instituto 19,8% de intenção de votos espontâneos, contra 14,4% de Serra. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo fora da disputa, aparecia com 9,7% das indicações. Agora, depois de muitos comícios e carreatas, Dilma pulou para 30,4% das intenções espontâneas e os apontamentos para Lula caíram para 5%. “Ela passou a ter identidade e musculatura política. Tem colhido os frutos do apoio do presidente”, observa o presidente da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), Clésio Andrade.

Com a candidata crescendo e com o menor índice de rejeição em relação aos rivais, 25,3% contra 30,8% de Serra e 29,7% de Marina, os petistas já apostam em vitória no primeiro turno. “Vamos ampliar a pressão. Em uma evolução como essa, é possível, sim, isso acontecer”, comemorou o líder do PT na Câmara, Fernando Ferro (PE). Já o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), desqualificou o resultado. “Eleição é coisa séria. Não comentaremos pesquisa do Sensus.” Serra, que pela manhã fez corpo a corpo no Mercado Municipal de São Paulo, desdenhou da sondagem. “Nem vi pesquisa”, limitou-se.

Extensão
Enquanto a ex-ministra assume aos poucos o papel de Dilma e deixa de ser vista apenas como extensão de Lula, a campanha tucana sente os impactos da estratégia de agredir o governo do presidente que teve aprovação recorde na série histórica da pesquisa, 77,5%. O diretor do Instituto Sensus, o cientista político Ricardo Guedes, atribui a queda do desempenho de Serra ao processo de transferência de votos de Lula para Dilma e ao excesso de críticas dos tucanos. Andrade atribui grande parte da popularidade do governo ao Bolsa Família.

O impacto dos programas sociais do governo é o principal entrave para os tucanos. Pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais sobre o Bolsa Família ganhará uma segunda etapa realizada por pesquisadores de Pernambuco para avaliar o programa do ponto de vista macroeconômico. O professor da Universidade Federal de Pernambuco Adriano Oliveira observa que a bolsa e o acesso ao crédito modificaram a paisagem de municípios pequenos. “Em muitos é possível ver uma rede de mercadinhos abertos depois do programa. O bolsa serviu para ativar essas economias”, afirma.

O número
30,4 %
Índice de intenção de voto para Dilma na pesquisa espontânea

http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia182/2010/08/06/politica,i=206347/DEBATE+INSOSSO+E+UM+FRANCO+ATIRADOR.shtml

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