15 de abr. de 2010

Marqueteiro de Serra apara arestas, reduz resistências e centraliza decisões

Marcelo Diego, iG São Paulo

Terça-feira, final de tarde gelada em São Paulo. Em um escritório localizado no Itaim Bibi, região de alto poder aquisitivo da cidade, estão reunidos os presidentes do PSDB, do PPS, do DEM, além das lideranças na Câmara e no Senado dos três partidos. Todos recebem a orientação de falar uma só língua durante a campanha presidencial e evitar desgastes desnecessários. Os políticos são lembrados de que fazem parte do mesmo time. O recado é dado pelo jornalista Luiz Zinger González, que deixa claro: “Assim meu trabalho fica mais fácil”.

González, neto de espanhóis, sócio das agências GW e Lua Branca, é o marqueteiro oficial da campanha de José Serra à Presidência da República. Também irá conduzir a comunicação da candidatura de Geraldo Alckmin ao governo do Estado de São Paulo. Seu nome não era unanimidade dentro do PSDB e teve que enfrentar resistências para ser apontado chefe da área. Tenta eleger pela primeira vez um presidente da República e mostrar que pode ser vitorioso fora das fronteiras de São Paulo.

Alguns dirigentes tucanos torciam o nariz para o marqueteiro desde 2006. Atribuíam a ele parte da culpa pela derrota de Geraldo Alckmin para o presidente reeleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A eleição chegou a ir para o segundo turno. Alckmin teve uma votação menor - fato inusitado - no segundo termo em comparação com o primeiro. Na ocasião, entre as vozes dissonantes, estavam a dos senadores Álvaro Dias (PR) e Sérgio Guerra (PE). O clima entre tucanos azedou mais quando González deu uma entrevista ao jornal “Valor Econômico”, reclamando da falta de apoio no segundo turno da eleição de 2006.

“Teve também a reação do Lula no segundo turno. Fez a famosa reunião no Palácio do Planalto com 17 ministros. Despachou um para cada Estado, escalou quatro para aparecer no “Bom Dia Brasil”, “Jornal Hoje”, “Jornal Nacional” e “Jornal da Globo”. Várias entrevistas do PT metendo a ripa no Alckmin e no nosso lado ninguém. O Tasso (Jereissati) estava no interior do Ceará, o Sérgio Guerra em Pernambuco, o César Maia sumiu. Consegui o Heráclito Fortes para dar uma coletiva”, declarou o marqueteiro, na ocasião.

As declarações causaram incômodo e reação. Lideranças tucanas disseram que o marqueteiro tinha uma visão apenas de São Paulo e que lhe faltava traquejo para entender as diferenças regionais do Brasil. Setores do PSDB chegaram a sugerir que o comando da campanha presidencial de 2010 ficasse nas mãos do publicitário Duda Mendonça, que conduziu Lula a vitória em 2002.

Quem bancou González foi Serra. Ambos estabeleceram uma relação de parceria e amizade desde 2004. Quem promoveu a reunião entre os dois foi outro tucano, Geraldo Alckmin, que o tinha como uma espécie de guru. Serra estava desgastado após ter brigado com Nizan Guanaes durante a campanha presidencial de 2002. Ouviu de Alckmin que González era um “craque”.

Semelhanças

A campanha de 2004 guarda, salvadas as devidas proporções, características semelhantes à disputa de 2010. Serra estava na oposição, enfrentava uma candidata do PT - Marta Suplicy -, com bons índices de popularidade e amparada por programas sociais de boa aceitação popular, como o CEU (Centro Educacional Unificado) e o Bilhete Único. A campanha foi centrada em uma grande mensagem: Serra é mais experiente, vai manter os programas e ainda conseguirá melhorá-los. Durante a campanha, Serra adotou uma nova postura. Evitou confrontos diretos, não respondeu a ataques e acusações. Saiu vencedor.

Renovou a parceira em 2006, quando foi candidato a governador. Participou da decisão que bateu o martelo no nome de González para comandar a campanha de Gilberto Kassab (DEM) à Prefeitura de São Paulo em 2008. Havia uma razão para isso. Durante a campanha de 2002, Serra se afastou do antigo PFL, agora DEM. O partido o acusava de ter implodido a pré-campanha de Roseana Sarney à Presidência. Ela foi abatida quando uma operação da Polícia Federal descobriu R$ 1,3 milhão em dinheiro vivo em uma das empresas ligadas a ela. Para poder pensar em voltar a ser um candidato competitivo à Presidência, Serra precisaria ter o DEM de volta ao seu lado. Isso passaria por fazer de seu antigo vice Kassab o prefeito eleito de São Paulo. González foi para a empreitada deixando de lado o antigo aliado Geraldo Alckmin. O democrata foi reeleito.

A dupla será refeita agora, tanto na campanha para o governo de São Paulo quanto na da Presidência. Essa foi também uma condição negociada por Serra, para não haver atritos entre as linhas gerais de comunicação das duas candidaturas.

Aversão aos holofotes

González terá de conciliar as duas agendas. Pouco afeito, segundo pessoas que trabalham com ele, com descentralização, costuma trabalhar quase 20 horas no auge da campanha. Não gosta de dar entrevistas, muito menos de ser fotografado. Conta com um time de profissionais de sua confiança como PC Bernades (responsável pelos programas de rádio e pelas músicas) e por Antonio Prado, o Paeco (responsável pelas pesquisas).

Participa de todas as decisões, seja dos programas de rádio e TV, aos discursos, contratação de profissionais, montagem das estruturas regionais. Ele diz que “campanha dividida é sinônimo de derrota”. Na primeira campanha que participou ao lado de Serra, um episódio tornou-se folclore. No início da gravação do programa de televisão, o tucano propôs uma alteração. Recebeu a seguinte resposta: “Fora daqui, o senhor manda, mas neste programa mando eu”. Nada foi alterado.

Sua participação na campanha presidencial só foi oficializada na semana passada. As cifras ainda são um mistério. Especula-se, nada além disso, que irá receber entre R$ 7 milhões e R$ 10 milhões - isso é faturamento, não lucro. Em campanhas presidenciais as despesas também são altas. É preciso montar uma equipe, pagar o custo da reinserção desses profissionais no mercado de trabalho, comprar equipamentos, montar complexas estruturas de apoio.

Depois da campanha, suas empresas de publicidade costumam ser contempladas com contratos dos governos. A agência alega que participa de licitações públicas. Ganha algumas, perde outras. Nega relação de causa e efeito.

Foi na condição de contratado do governo do Estado de São Paulo que ajudou o então governador José Serra com o discurso proferido no dia 30 de março no Palácio dos Bandeirantes. Ali, o tucano fez um balanço de sua gestão e terminou usando o bordão “O Brasil pode mais”. O mesmo slogan foi repetido no último sábado, quando Serra se lançou oficialmente como pré-candidato do partido à Presidência.
A mensagem já havia sido utilizada por Geraldo Alckmin em 2006 e na campanha da chapa oposicionista que ganhou as eleições para o comando do Santos Futebol Clube no ano passado (“O Santos pode mais”). Fábio González, irmão do marqueteiro, é sócio do clube, participou da chapa vitoriosa e hoje trabalha no departamento jurídico santista. Fábio diz que não participou da tomada de decisão do mote de campanha. "Até onde eu sei, foi a equipe de marketing que desenvolveu este slogan. E parece que o Alckmin já tinha citado também uma vez", disse Fábio. Ele achou toda a celeuma curiosa.

Mão na massa

Não só o slogan, mas praticamente todo o evento teve a mão do marqueteiro. Em 2006, a campanha tucana foi lançada em Minas Gerais. Desta vez, o cenário escolhido foi Brasília. Mais central, com a presença de um número maior de jornalistas, mais bem preparada para reverberar e repercutir a mensagem transmitida.

A festa partidária aconteceu em um sábado de manhã. González foi responsável por escolher as imagens que ilustravam o centro de convenções, pela montagem do palco de cerca de 30 metros de comprimento. Por sugestão dele, Serra abandonou o terno e a gravata e se apresentou de camisa social azul, com as mangas arregaçadas. Seu discurso reforçou esta imagem de homem simples, de origem humilde. O tom do discurso foi mais cordial, com poucos números, evitando ataques, mas passando mensagens. O conteúdo foi revisado inúmeras vezes, numa constante troca de mensagens entre ele e o pré-candidato.

Entre as mensagens transmitidas, a de que Serra vai manter os programas do governo Lula e até melhorá-las e a de que ele é um candidato conhecido e não uma aventura - numa alusão velada ao fato de Dilma Rousseff, postulante ao cargo pelo PT, estar disputando a sua primeira eleição.

Foi também dele a idéia de chamar a apresentadora Ana Hickmann para apresentar a cerimônia. O intuito era utilizar um rosto novo, evitando artistas consagrados. E estabelecer uma comunicação com os mais jovens. O evento custou R$ 500 mil - dos quais parte para pagar o cachê da apresentadora, contratada da Rede Record.

O evento foi considerado bem sucedido, até porque transmitiu a imagem de unidade do partido. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) chegou a ter sua participação ameaçada. No sábado, porém, entrou no palco ao lado de Serra e fez um discurso muito aplaudido pelos presentes.

O cenário também foi montado para que não houvesse constrangimento ao ex-governador Aécio Neves. O próprio González admitiu, em conversas privadas, que, se Aécio fosse o vice de Serra, também facilitaria muito o seu trabalho.

González diz que Marta saiu derrotada da eleição de 2004 porque apostou numa divisão da cidade entre ricos e pobres. Não por acaso este foi um dos temas do discurso de Serra no último sábado. “O nós contra eles não cabe numa nação”, disse o tucano.

O marqueteiro assumiu um compromisso com Serra - neste ano não haverá oscilações no discurso como em 2002. Naquela ocasião, o tucano titubeou entre defender o legado de FHC e adotar uma postura mais independente, com um discurso de mudança. “Não tenho problema com o meu passado”, diz Serra.

Para González, o primeiro passo numa campanha é a chamada “disputa pela agenda”, determinar os assuntos considerados os mais importantes. Para o marqueteiro, ou o candidato impõe a agenda ou é dominado por ela.

Em sua estratégia, a campanha de Serra pode se consolidar a partir dos seguintes passos. Primeiro, apontando como e por que o tucano é diferente de Lula e do PT, mas sem provocar a hipótese de ruptura. Depois, ressaltar sua experiência como tocador de obras, lembrando inaugurações como o Rodoanel e o Metrô de São Paulo. O terceiro passo é a comparação de biografias, chamando Dilma para uma discussão programática, evitando o clima de confronto. E por fim nacionalizar o discurso. Da cor da camisa a estratégias de campanha, González deve participar de cada um desses passos.

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